Se se discorre sobre este tema, logo surgem opiniões diversas. Mas é neste contexto que os
instrumentistas e os construtores têm algo em comum: ambos trabalham a vida inteira nele:
o som.
Gosto, sensibilidade, força, constituição física, costume, tudo isso influencia a maneira como
cada um toca. Cada instrumentista tem sua característica sonora própria; não existe um som
igual, ainda que para isso sejam usados o mesmo instrumento e a mesma palheta.
O som de cada instrumento depende da quantidade de harmônicos. Com a ausência destes
harmônicos o som se torna escuro, fica comprometida a projeção e a emissão se torna
pesada. O fator dos harmônicos é, pois, um elemento vital para um construtor. Ele precisa
dominar as relações sonoras corretas, o que também será conseguido com o uso de uma
madeira que seja estável, que conserve as medidas da perfuração e que assim possa garantir
a qualidade do instrumento por muito tempo. O complexo mecanismo das chaves precisa
trabalhar com precisão sem grandes tolerâncias. Um instrumento de plástico nunca ocupará
numa orquestra o mesmo lugar que um instrumento de madeira. O plástico é um bom
condutor térmico, aquece mais que a madeira e também esfria muito mais rapidamente. As
diferenças de afinação daí decorrentes são muito grandes e quase incontroláveis.A perfuração é a alma do instrumento. Neste sentido correm paralelamente a afinação, a
sonoridade, a emissão. Qualquer alteração na perfuração altera todos estes fatores num
instrumento de sopro de madeira . A lisura da superfície da perfuração é um fator importante
do som. As pesquisas neste campo procuram ainda definir as influencias de uma superfície
lisa e de uma superfície mais áspera sobre o som.Por ser este campo da sonoridade tão complexo, aconselho que, ao se promoverem
alterações em um instrumento, que sejam sempre baseadas nestas considerações. Nas últimas
décadas os instrumentos de sopro de madeira ficaram tão refinados como nunca. Um mestre,
que desenvolveu seu instrumento de tal maneira, tem seus motivos para fazê-lo da maneira
como o fez.
Para um bom "soprar" são necessários quatro elementos:
- um bom instrumento bem cuidado;
- um tudel muito bem escolhido;
- uma palheta excelente e
- um músico competente.
Se um destes fatores é imperfeito, não se pode esperar execução perfeita. No fagote o tudel
é uma parte importante; costuma-se até dizer que o tudel é um instrumento para si. Um
segundo fagotista na orquestra usará certamente um tudel diferente do primeiro, pois este
precisará tocar com facilidade os agudos, enquanto aquele deverá explorar muito mais os
graves. Para passagens específicas da literatura fagotística existem até mesmo tudéis
especiais, que facilitam a execução.
O instrumentista deveria manter contatos periódicos com outros colegas a fim de trocar idéias
no que diz respeito às medidas das palhetas, para não incorrer no erro de enveredar por um
caminho de mão única, se acostumar com ele e não conseguir voltar atrás. Neste sentido os
cursos, congressos e encontros poderão alargar os horizontes.O acomodamento a um único estilo, seja ele bom ou ruim, precisa muitas vezes ser
controlado e, mesmo contrariando o orgulho próprio, ser também questionado.
AFINAÇÃO
Quero tocar num ponto, que diz muito respeito aos instrumentistas de sopro. Muitos
acreditam, pelo fato de tocarem um instrumento de marca, que somente por isso dominam a
afinação. "Eu sou afinado": este posicionamento é falso e levará naturalmente a colisões com
outros colegas envolvidos. Em uma orquestra, sem ceder e se ajustar ninguém estará afinado.
Quando se fala em afinação subentende-se: 1. a freqüência de um
determinado instrumento e 2. a exatidão da relação intervalar entre as notas e oitavas.
Um dos elementos que influencia a acústica da afinação é a temperatura. Ideal é uma
temperatura que varia entre 20 e 24 graus Celsius. Grandes alterações de temperatura
alteram as relações de afinação.Aí entram a experiência e a percepção do instrumentista. Um
aquecimento de 10 minutos é, em condições normais, o mínimo. Se se tem a oportunidade de
usar um afinador eletrônico, que se faça uso dele tocando como se estivesse tocando na
orquestra, com engajamento e expressão, pois caso contrário as aferições não serão reais. A
afinação dos grupos de instrumentos de uma orquestra é um problema constante e, com
certeza, não será resolvido matematicamente. Por isso a reação do músico e a sensibilidade
serão o elo entre a teoria e a realidade.
Cada instrumento deverá ser testado em sua afinação com uma determinada pressão. Se esta
pressão for pouca, a afinação cai, a relação intervalar desmorona; notas curtas costumam
baixar relativamente mais que as notas longas. Também fica comprometida a projeção, o som
fica abafado, oco e rouco. O contrário acontece quando se aplica muita pressão; isto, porém,
acontece menos freqüentemente, pois demanda mais energia.
Também a idade do instrumentista tem seu papel. A resistência diminui naturalmente com a
idade, assim como a percepção das freqüências agudas e graves. Freqüentemente isso faz de
um músico objeto de gozação, ainda que ele por muitas décadas tenha sido um bom
musicista. Isso tudo reforça as dificuldades e os problemas que surgem em uma orquestra e
com as quais cada músico tem de se confrontar. É um problema mais de natureza psicológica;
neste caso o construtor de instrumentos poderá ajudar muito pouco, no máximo poderá dar
alguns conselhos...
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