a trajetória de um fagote brasileiro

Desde 2007 o protótipo de meu fagote, construído aos trancos e barrancos, à base de "prego e martelo" como costumo falar, faz parte do acervo do "Museu da Música" em Timbó, SC, estado onde nasci e uma região onde meu pai, como jovem imigrante alemão, deu no Brasil seus primeiros passos. Além do mais, me chamou a atenção a importância de um museu dedicado única e exclusivamente à música, plantado no interior de uma cidade catarinense; achei que este museu deveria ser o depositário de um instrumento que, de certa maneira, com sua pequena história também já é uma peça da história.

A idéia (absurda) de se construir um fagote no Brasil nasceu de uma conversa informal. Entre amigos fagotistas, quase em tom de desafio, surgiu a idéia de construir um fagote; isso para solucionar a falta de instrumentos no Brasil e/ou as dificuldades de importação. Desafio aceito, os primeiros passos foram difíceis, mas as pesquisas logo começaram e os primeiros resultados foram aparecendo...

Marcante para a decisão de construir um fagote sem um mínimo de conhecimento específico fora o fato de eu ter, em 1990, feito um estágio de manutenção de instrumentos na Alemanha, junto à firma Püchner. Também este estágio foi motivado pela falta de elementos capacitados nesta área.

Foram muitas as pesquisas e as buscas por madeiras, vernizes, metais, moldes, brocas, revestimentos, ferramentas, tecnologias, conhecimentos, paciência... e quantas coisas mais se fizessem necessárias para se construir o primeiro fagote, até que finalmente ele pode se apresentar. Depois de muito experimentar em terreno praticamente minado, pois nunca pisara este chão anteriormente, em novembro de 1991 aconteceu o batismo oficial de um fagote totalmente feito em Brasília, o mesmo que agora está no Museu da Música de Timbó.

O ateliê foi improvisado no fundo do quintal de minha casa, onde, com alguns poucos melhoramentos continua até hoje. Os momentos de trabalho se revezavam de um canto a outro dentro deste ateliê, pois inúmeras são as operações necessárias para dar forma e vida a um fagote. Que será mais difícil: tocar um instrumento ou construí-lo?

Cada instrumento pronto recebia seu devido batismo numa apresentação de orquestra, num recital ou num concerto de música de câmara, passando também pelo crivo de alunos curiosos e professores experimentados. Afinal os instrumentos deviam ser aprovados no teste mais importante que é a própria música...

Junto com os fagotes veio o aprendizado, pois cada novo fagote tinha por obrigação superar eventuais problemas e deficiências de seu representante anterior. Não só isso: também a curiosidade por novidades. Ao comemorar meus 50 anos de idade fiz um recital festivo, no qual inaugurei um fagote branco, que recebeu a designação de op. 20. Esta denominação me levou enganosamente a ser identificado em uma das reportagens escritas na Alemanha também como compositor (o que nem de longe corresponde à verdade!).

Uma destas bem-sucedidas experiências foi a criação de um fagote infantil que satisfizesse as necessidades do iniciante ao fagote em idade precoce, fato que ocorre atualmente cada vez com maior freqüência; o  modelo Junior veio para ajudar a resolver estes problemas...

Estes anos todos de trabalho  produziram vários instrumentos, espalhados não só pelo Brasil, mas também honrosamente representados nos EUA e em Cuba, e nada mais gratificante do que poder tocar seu próprio instrumento ou ver um conjunto de instrumentos da marca SCHWEIZER tocando juntos.

O som de um dos fagotes por mim confeccionados está documentado num CD, ao qual denominei "Com licença!..." e onde faço um pequeno retrato autobiográfico de minhas atividades na área do fagote; são fotos musicais de meu tocar, de meu fazer, de meu ensinar...

E, passados agora quase 20 anos, o Brasil pode se orgulhar de produzir seu próprio fagote.

Este pequeno histórico da trajetória de um fagote brasileiro,  documentado com algumas imagens,  mostra que o Brasil também se faz representar no seleto rol dos fabricantes de fagote...

Brasília, novembro de 2007 (por ocasião da doação do primeiro fagote construído no Brasil ao Museu da Música de Timbó, SC).

                Hary Schweizer         

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