4 de dezembro de 2006

 

 

por Flávia Lima

 

    Ele é o único fabricante de fagote na América Latina. Em uma chácara próxima ao Varjão, cercado de árvores e animais, o músico Hary Schweizer vive e brinca de construir fagotes. Quando não está na oficina criando e consertando instrumentos, o músico se divide entre ensaiar para as apresentações do primeiro CD, Com licença!..., e para as apresentações da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional, da qual é um dos fundadores.
    O fagote é um instrumento musical de sopro. Possui corpo de madeira, chaves de metal e som grave. Deve ficar apoiado no corpo do músico para ser tocado. Cada fagote pesa em média três quilos.
    Ma oficina de Hary Schweizer, o fagote é construído artesanalmente. Cada instrumento é um pouco diferente do outro. A qualidade do fagote depende da qualidade da madeira e do metal.
    - Mas o segredo está na paciência - conta o músico. - Eu brinco de construir fagotes. É complicado fazer, mas não é impossível. É questão de meter a cara - afirma.
    Foi em 1991 que Schweizer resolveu meter a cara. Na época, era professor de música na Universidade de Brasília. Foi o trabalho na UnB que fez despertar no professor a vontade, e necessidade, de aprender a fazer o instrumento. Eram pouco os artesãos que construíam fagotes, mesmo na Alemanha, onde o instrumento nasceu.
    -Era difícil importar fagotes - afirma. O alto preço da peça também pesou. Segundo ele, um bom fagote (mesmo usado) não custa menos de R$ 7 mil.
    Para aprender a arte de criar um fagote, Schweizer buscou ajuda no próprio instrumento.

 

    
 

        Schweizer e seu fagote infantil

 

    O músico e artesão ensina que mesmo em fábricas grandes da Alemanha a fabricação de fagotes é uma tradição familiar. Ensina também que os fagotes chineses são descartáveis. Aqueles vendidos nas lojas de departamentos, segundo ele, são de péssima qualidade. Antes recebia muitos deles na oficina para consertar. Joje não os aceita mais.
    Mas quem pensa que o artesão brinca de construir fagotes só pensa nos adultos, engana-se. Graças à professora Cristina Costa, Hary Schweizer começou a construir instrumentos para crianças.
    Segundo ele, Cristina estava preocupada com a doença que atinge a maioria dos músicos: a dor ao tocar.
    - Decidimos adaptar o instrumento para as crianças. Sem que elas tenham dificuldade de adaptação qaundo pegarem um instrumento de adulto - explica.
    A atividade de construir instrumentos é levada a sério. Mas é feita apenas por prazer. O artesão não tem uma fábrica de fagotes. Não conta quantos instrumentos já construiu, mas revela que gasta muito tempo construindo cada um.

 

Paixão pelo instrumento levou musico para a Alemanha e o trouxe para a UnB.

Ansiedade às vésperas do concerto

A paixão pelo instrumento não veio desde cedo. Os estudos de música começaram em Curitiba. Quando tinha lá pelos 25 anos, em curso de verão, Hary Schweizer conheceu professores de fagote da Alemanha. Foi aí que se aproximou do instrumento pela primeira vez. Para um filho de alemães nascido em Santa Catarina, não foi nada difícil trocar o Brasil pela terra do fagote.

- Fui com a cara, a coragem e a roupa do corpo - brinca. Na Alemanha, ficou quatro anos.

Em Munique, para viver, trabalhava em uma loja de música clássica. Foi onde aprendeu muito do que sabe sobre música instrumental. Uma coincidência do destino fez com que o artesão de nome difícil voltasse para o Brasil. Na loja, Schweizer viu quando entrou o quarteto de cordas da UnB. Reconheceu o grupo na hora.

- Eu os atendi em português e depois de uma boa conversa recebi o convite para dar aulas em Brasília - lembra. O músico não se arrepende. Gostava da Alemanha, mas queria voltar para o Brasil.

Seis meses depois desembarcou na Universidade de Brasília. Lá foi professor durante 20 anos.

- Ser professor de fagote sem dispor de instrumentos suficientes para atender aos alunos requer um toque de magia. Mesmo assim formei bons alunos, que hoje estão tocando nos Estados Unidos, na Alemanha  além do Brasil. Eles estão lançando a semente para a frente - diz, orgulhoso.

Mercado para bons músicos existe. Nem sempre paga bem, mas axiste, acredita. Na sua opinião, a música não é um mercado bem estabelecido se o profissional não tiver a estrutura de uma orquestra ou uma instituição de ensino.

Em cada orquestra que se preze, há quatro fagotistas. A orquestra Sinfônica do Teatro Nacvional é assim. O fagote de Hary Schweizer é acompanhado de mais três.

O único fabricante do fagote na América Latina promete mostrar boa música e bons instrumentos na próxima quinta-feira, às 21 horas no Teatro da Caixa. O concerto é especial. Marca o lançamento do disco Com licença!... . Mas não é só isso. Antes da apresentação de Hary Schweizer, o público poderá conferir um documentário de 18 minutos, intitulado O Artesão do Vento, com direção assinada por Dora Galesso.

O filme se passa na oficina onde Schweizer fabrica os instrumentos. A idéia era mostrar o processo de criação do fagote: da madeira bruta ao instrumento pronto.

Sobre o concerto, o músico não esconde o entusiasmo. Com um sorriso no rosto, garante que a apresentação será muito boa. - Uma apresentação tem que ser diferente de ouvir o disco em casa. Quero um contato maior com quem for me ouvir - afirma.

No repertório do disco, o destaque vai para uma música inédita de Tom Jobim Mágoas de Fagote.  A música que dá nome ao disco, Com licença!..., foi escrita pelo maestro Júlio Medaglia.

Duas canções de Chiquinha Gonzaga estarão presentes: Lua Branca e O Corta-Jaca. O fagotista passeia também por ritmos como o tango, o chorinho e o samba.

No encarte do disco, o músico escreveu: Um fagote feito no Brasil sente-se naturalmente bem tocando música brasileira. E assim ele foi à boemia; neste passeio encontrou, além de Ernesto Nazareth e do pernambucano Benny Wolkoff, um rascunho inacabado  que o Tom não publicou, documentando assim o que talvez seja a primeira gravação de uma música para fagote de Tom Jobim.

O solista tocará no Teatro da Caixa acompanhado por um grupo de câmara formado por mais dois fagotes, executados por dois ex-alunos, Flávio Lopes de Figueiredo Jr e Gustavo Koberstein, pela pianista Elza Kazuko Gushikem e pelo baterista Paulo Marques. Os ingressos custam R$ 16 (inteira).

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