conversa de fagotista |
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- rogério gonçalves - |
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portal do fagote - Todos por aqui sabem da atuação de um fagotista brasileiro na Suiça, Afonso Venturieri. Mas foi uma surpresa tomar conhecimento que mais um fagotista faz sucesso por lá. Como aconteceu de Você parar na Suiça? |
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Rogério – Vim à Suiça para estudar música antiga em Basiléia e Genebra. Em Genebra encontrei minha “cara metade”, me casei, compramos uma casa nas montanhas do Jura (perto de Lausanne e do lago Leman). Tivemos três filhos: Iara (7 anos), Ester (3 anos) e o Ruben (7 meses). Foi assim que eu fui parar na Suiça e eu acho que vou “parar” pra sempre por aqui.
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portal do fagote - como se deu o contato com o fagote, um instrumento que no Brasil ainda tem um certo ar de raridade? |
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Rogério – O meu primeiro contato com o fagote aconteceu em Londrina no Paraná, minha cidade natal, onde existe uma orquestra sinfônica, a “Orquetra Sinfônica da Universidade Estadual de Londrina”. Lá, dei meus primeiros passos no estudo do fagote assim como meus primeiros contatos com a música orquestral.
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portal do fagote - com quem teve a iniciação ao fagote? |
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Rogério – De início minha formação foi puramente autodidata, pois em Londrina não existiam professores. Aprendi toda a base do estudo fagotístico sozinho... Me lembro muito bem de ter ficado horas tentando decifrar as tabelas de posições do instrumento e muitas outras horas tentando descobrir como se fabricaria uma palheta. Nessa época eu estudava em média oito horas por dia tentando decifrar os enígmas de um instrumento totalmente desconhecido para mim mas que me fascinava. Depois desse período de “descoberta” eu tive a oportunidade de acompanhar os cursos de fagote do Festival de Música de Londrina. Nesse festival eu tive aulas com Alejandro Aisemberg (Argentina), Pedro Sierra (Chile) e Elione Medeiros (Brasil).
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portal do fagote - e a formação específica de música antiga? |
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Rogério – Em Londrina eu tive a felicidade de fazer parte de um grupo de música antiga (que infelizmente não existe mais) o “Arabesco”. Os integrantes desse grupo faziam também parte da Orquestra Sinfônica da Universidade e foi lá que nos encontramos. Em 1990, nós do grupo "Arabesco" decidimos que deveríamos nos aprofundar no estudo da interpretação da música antiga. Então partimos todos juntos à Suiça (em Basiléia) para um estudo na famosa “Schola Cantorum Basiliensis”, onde eu segui os cursos do professor francês Claude Wassmer. Esse estudo no meu caso durou cinco anos, até 1995, terminando com um diploma em fagote barroco e um outro de música medieval. A partir de 1995 eu segui num aperfeiçoamento com o famoso professor argentino Lorenzo Alpert (considerado o melhor do mundo); isso aconteceu no setor de música antiga do Conservatório de Genebra, onde eu recebi um diploma de fagote barroco em 1999.
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portal do fagote - e do fagote “moderno” ao fagote “antigo”; como foi esta transição e/ou adaptação? | |
Rogério –
No meu caso o pulo não foi tão
grande, pois eu tocava muito mal o fagote “moderno”, nenhuma técnica,
nenhuma afinação, nada. Eu tive que começar o fagote barroco do zero.
Aprendi a verdadeira técnica do instrumento, todas as artimanhas da
fabricação das palhetas, embocadura, restauração, enfim todo o
aprendizado do instrumento eu tive na Europa.
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portal do fagote - como se sente um brasileiro na Suiça? |
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Rogério – Muito bem obrigado! Me sinto muito bem na Suiça. É verdade que nós podemos nos sentir um pouco colocados à parte pelos colegas músicos, sendo de um país tão distante, famoso por seu futebol, por sua pobreza e violência; as pessoas tem um certo receio ao primeiro contato conosco. Eles fazem muitas perguntas com relação ao país e ao estudo e à vida musical brasileira. Eles sempre se espantam em saber que no Brasil existem conservatórios e orquestras sinfônicas.
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portal do fagote - onde está centrado seu campo de atuação? |
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Rogério – Toco muito aqui na Suiça com os grupos “Ensemble Elyma”, “Capriccio Barockorchester”, “Swiss Consort”, “Ensemble Ad Fontes”, “FreitagsAkademie”, “Ensemble Turicum” e “Ensemble Baroque du Léman”. Faço parte de uma orquestra barroca na Áustria, “L'Orfeo Barockorchester”. Na Holanda eu toco na “Nederlandse Bachvereniging”. Na França, eu toco na Orquestra “L'Hostel Dieu” de Lyon. Na Espanha com o grupo galego “Resonet” e na Itália com a “Capella dei Turchini” de Nápoles.
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portal do fagote - como dá conta de tamanha atividade? | |
Rogério –
Eu estou sempre viajando... Todas as semanas eu estou em
um país diverso tocando os mais diferentes repertórios e que são no meu
caso: barroco, clássico e romântico, e sempre com o respectivo
instrumento com a sua afinação da época. Normalmente os concertos
acontecem nos finais de semana e os ensaios começam sempre ou na quarta
ou quinta-feira. Por isso eu sempre estou em casa na segunda e
terça-feira para poder me preparar para o concerto da semana e
logicamente para poder dedicar-me a minha familia.
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portal do fagote - tem algum compositor preferido ou alguma música em especial? |
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Rogério – Tenho como meus compositores prediletos Jean-Philippe Rameau (que escreveu belíssimas óperas nas quais o fagote tem um papel predominande e difícil) e Wolgang Amadeus Mozart (que é para mim um fonte infinita de inspiração). Eu também gosto muito da música ibérica do século XVII por sua riqueza harmônica e rítmica.
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portal do fagote - pensa em voltar ao Brasil? |
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Rogério – Volto ao Brasil só para visitar a minha família em Londrina. Não seria possível morar no Brasil, pois sou casado com uma holandesa e ela é muito alérgica às picadas de inseto (por isso uma vez ela já foi parar no Hospital...). E inseto é coisa que não falta no Brasil, não é?
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portal do fagote - e "A Corte Musical", seu conjunto da foto do cabeçalho desta conversa? |
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Rogério – É um trabalho que comecei já há alguns anos. A Corte Musical é um grupo de música que interpreta a música antiga da península ibérica dos séculos XVI e XVII. Atualmente trabalhamos muito o repertório dos vilancicos portugueses do século XVII, provenientes do arquivo da Biblioteca Pública de Évora. Uma música maravilhosa com texto em vernáculo. Já gravamos três discos, um deles recebeu na Holanda o prêmio de melhor disco barroco do ano de 2007 e outro um “5 diapasons” na França.
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portal do fagote - Na França temos Ricardo Rapoport, também um fagotista brasileiro, que igualmente tem vasta atuação com fagote barroco; Vocês mantém algum intercâmbio? | |
Rogério –
Infelizmente não mantemos
nenhum contato. Só nos encontramos em uma ocasião em Paris em 1992, ele
foi muito simpático me deu uma boa impressão do seu trabalho. Nessa
ocasião só conversamos alguns minutos e depois tchau, nunca mais nos
vimos. Eu escutei o seu último disco com as sonatas de Dard, um disco
bem interessante...
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portal do fagote - É de seu conhecimento o que acontece em Juiz de Fora (MG), com seus festivais de inverno abordando a música colonial brasileira e registros fonográficos daí advindos? | |
Rogério –
Só conheço o festival de Juiz de Fora pelo nome, nunca
participei a um de seus eventos. Admiro muito o trabalho desse festival
com relação à redescoberta do repertório do período colonial do Brasil,
mas os discos daí advindos foram infelizmente de muita má qualidade.
Atualmente eu não sei se a qualidade dos discos melhoraram... deve ter
melhorado, pois me disseram que esse festival possui atualmente uma
orquestra barroca dirigida por um ótimo violinista. Devo dizer que a
música colonial me interessa muito. Como fagotista do grupo suiço de
música antiga "Turicum" já participei da realização de quatro discos de
música colonial. Devo dizer que nossos arquivos possuem verdadeiras
pérolas e que essas jóias devem ser mostradas ao público.
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portal do fagote - que diria ao estudante brasileiro que pensa em estudar e/ou atuar na Europa? | |
Rogério – Que não pare de sonhar... com amor e
dedicação tudo é possível. Que o fato de ir estudar e por conseqüência
morar na Europa possa parecer um “bicho de sete cabeças”, não é verdade.
Com força e vontade todas as portas se abrirão. O mais importante é de
aprender bem a língua do país onde irá estudar e de sempre estar aberto
ao aprendizado que irá ter e de obviamente estudar o instrumento a 2000
por cento. Mas o mais importante de tudo é de amar muito o fagote, pois
ele é um senhor muito exigente e ingrato...
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portal do fagote - Rogério, parabéns por suas atividades; agradecimentos por esta conversa informal e descontraída.
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swissinfo.ch reportagem de 17 de dezembro de 2004 J. Gabriel |
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