obras de compositores brasileiros

para fagote solo

dissertação de mestrado, UNI-RIO, 1999

ARIANE PETRI

 
INTRODUÇÃO

A idéia da realização deste trabalho surgiu quando consultávamos os catálogos de obras para fagote existentes no mercado. Procurávamos por peças de autores brasileiros. Mesmo nos catálogos mais recentes, e vale a pena dizer que, destes, somente entre 1989 e 1994 foram publicados quatro 1, a busca de dados foi decepcionante. Até na publicação elaborada por Bodo Koenigsbeck, a mais completa das bibliografias para fagote, que reúne métodos para fagote, concertos e música de câmara para até 16 executantes, o número de obras brasileiras citadas entre os 21.000 títulos é minúsculo. Nele encontramos 83 títulos, cuja grande maioria é para conjuntos de música de câmara, enquanto somente dois são para fagote solo e três para fagote e piano.2 Baseada na certeza de que a divulgação de informações sobre a literatura brasileira para fagote poderia enriquecer, e não pouco, o repertório tocado em concerto e usado em sala de aula, propusemo-nos a reunir um acervo de peças brasileiras para esse instrumento. Considerando que trabalhar sobre todo o material de música de câmara iria além dos limites de uma dissertação, restringimos a pesquisa às obras para fagote solo.

Cabe, ademais, ressaltar a relevância do repertório sem acompanhamento: além de proporcionar excelente material para o ensino musical, é de grande interesse para o profissional. No primeiro caso, o aluno pode estudar uma obra por inteiro, conhecendo desde o início a composição completa, ao invés de aprender primeiro a linha musical do solista para depois juntar o acompanhamento. Para o profissional, as boas obras representam um tesouro porque personificam o instrumento e expressam a sua essência. Quando apresentadas em público, estas obras possibilitam uma unidade incomparável e um diálogo direto entre o músico, a peça e o público. Além disto, a individualidade na expressão é mais facilmente alcançada do que quando em conjunto com músicos, já que não existem as dificuldades que tocar em grupo podem trazer.

O trabalho mostrou-se necessário e útil tanto pelo já referido desconhecimento da produção musical contemporânea para fagote, como também pela dificuldade de acesso à mesma, uma vez que grande parte dela ainda não foi editada. Junte-se a isso uma certa resistência ao conhecimento e uso de técnicas contemporâneas, como, por exemplo, multifônicos, alteração e oscilação de afinação etc. usadas por alguns compositores, uma vez que o ensino dessas técnicas geralmente é descuidado, mesmo em nível universitário. Aprendê-las autodidaticamente é penoso, fato que pode desanimar muitos fagotistas a incluir tais peças no seu repertório. Todos esses pontos contribuem para a enorme escassez de execuções do repertório abordado em programas de concerto.

O objetivo desta pesquisa é, pois, elaborar um catálogo que facilite o acesso à produção musical contemporânea para fagote solo, através do qual esperamos colocar à disposição dos fagotistas e outros interessados um material que sirva como referência para o “descobrimento” e escolha de repertório, além de fornecer informações úteis para a montagem de programas de recitais e concertos.

Para a organização do acervo de obras nele apresentadas, foram consideradas todas as obras sem acompanhamento, sejam elas peças autônomas (intituladas Sonatina, Estudo, Tema e Variações etc.) ou peças dentro de um contexto maior, por exemplo as integrantes de uma coletânea para instrumentos solo. Transcrições para fagote que não tenham sido feitas pelo próprio compositor, ou peças que possam ser executadas por qualquer outro instrumento, não foram incorporadas ao corpus, já que não foram pensadas visando o aproveitamento das características do fagote. As obras incluídas no trabalho não levaram em conta critérios seletivos de gosto pessoal ou de valor. Não podemos assegurar, porém, que isto não se expresse de alguma forma na parte referente aos comentários sobre alguma peça.

Conseguimos reunir 36 peças, de autoria de 29 compositores, escritos entre 1954 e 1999. Os procedimentos para chegarmos a este número foram bastante diversificados. Consultamos os catálogos do Itamaraty, editados até 1977 (e que por isso só poderiam informar sobre peças escritas até esse ano) e, paralelamente, pesquisamos em arquivos públicos no Rio de Janeiro (Biblioteca Nacional, Biblioteca da Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Biblioteca Pública da Universidade do Rio de Janeiro) e em Campinas (Centro de Documentação da Música Contemporânea CDMC - Brasil/UNICAMP). De todos, a Seção de Música da Biblioteca Nacional (com nove peças) mostrou-se a fonte mais completa, apesar de que, em comparação com o total de peças encontradas e reunidas neste trabalho, esse número ser pequeno. Quanto à pesquisa em arquivos particulares, limitamo-nos a recorrer aos fagotistas que mais se têm preocupado com o repertório brasileiro, a saber, Noël Devos, no Rio de Janeiro, e Mauro Mascarenhas, em Belo Horizonte.

Noël Devos, francês naturalizado brasileiro, é um dos fagotistas mais atuantes no país e se dedica, desde que chegou ao Brasil, em 1952, à difusão do repertório nacional. A sua presença no cenário musical brasileiro representa um incentivo aos nossos compositores para escreverem para seu instrumento. Tanto pela convivência com vários compositores brasileiros ao longo da carreira, como pelo reconhecimento que goza no país e na América do Sul, certamente é uma das pessoas mais bem informadas em relação à temática desta dissertação. No seu arquivo particular encontramos 21 obras brasileiras solo, das quais nove são as mesmas à disposição na Biblioteca Nacional. Essa base para nosso acervo pôde ser complementada, especialmente no que se refere a obras solo mais recentes, através de informações prestadas por Mauro Mascarenhas, as quais ele obteve durante a pesquisa para a sua a dissertação de mestrado Música de Câmara Brasileira para Fagote e Piano: Catálogo de Obras defendida em março de 1999 na Escola de Música da UFRJ (MASCARENHAS 1999).

Por fim, enviamos uma correspondência,3 em forma de carta ou e–mail, para os 233 compositores citados no Musicon - Guia da Música Contemporânea Brasileira 1998,4 publicado pelo CDMC, solicitando informar se escreveram obra solo para o instrumento, e, em caso afirmativo, responder a um questionário 5 remetido em anexo.

O contato com os compositores teve como resultado um total de nove peças que ainda não tinham sido encontradas por outros caminhos, sendo que, destas nove, três já estavam compostas e seis outras foram escritas por estímulo da pesquisa. Julgamos ser o acréscimo de seis peças ao repertório para fagote um feliz resultado parcial do nosso trabalho.

No catálogo, apresentamos aquelas características composicionais e instrumentais que nos pareceram mais relevantes; indicamos, se conhecidos, data e local da composição, duração aproximada; data e local de estréia e grau de dificuldade das obras estudadas. Quando existem gravações da peça, indicamos a gravadora, número da gravação e nome do artista executante. A indicação do local onde encontrar a partitura 6, seja em arquivos públicos, editora ou arquivo pessoal do compositor, ajudará na sua obtenção. As informações foram organizadas como indicamos a seguir, levando-se em conta que as informações sobre as obras (publicação, data e local de composição e de estréia etc.) foram apresentadas em forma de sinopse, as demais, em texto corrido.

 

COMPOSITOR (ano e local de nascimento e morte)

  • Título da peça (data e local da composição)

  • Dedicatória

  • Comissionamento

  • Data e local da estréia, nome do artista

  • Nome e local da editora, data da publicação

  • Gravação comercializada: gravadora e número; artista

  • Número e nome dos movimentos

  • Duração 7

  • Comentários analíticos acerca da peça, versando sobre aspectos rítmicos, melódicos, harmônicos, texturais, timbrísticos, notacionais e estéticos, com exemplos da partitura, quando necessário

  • Comentários acerca das exigências técnicas das peças, particularmente no que se refere à resistência necessária à execução de cada uma delas; indicação do grau de dificuldade da obra

  • Discussão de possíveis erros no manuscrito ou na partitura impressa

  • Outras observações não explicitadas nessa listagem

No que se refere à forma de organização do corpus, as obras foram agrupadas segundo suas características idiomáticas e estéticas, para criar a possibilidade de uma imediata comparação.

Como todas elas foram compostas nas últimas cinco décadas, a diversidade estética e de estilos composicionais é enorme, não existindo ainda, entre os teóricos, um consenso firmado a respeito da denominação destes vários caminhos. Optamos, então, por aplicar os termos genéricos tonal e atonal. Na distribuição das obras nestes dois blocos foram feitas as subdivisões tonal e tonal livre (com e sem uso de elementos nacionalistas) e atonal (com e sem elementos seriais).8 Ainda foram agrupadas, em cada bloco, obras que se utilizam de técnicas pouco convencionais de produção sonora.

As denominações empregadas devem ser entendidas como ‘rótulos’ que descrevem características predominantes, mas que não excluem, por exemplo, em uma obra considerada ‘tonal livre’, o aparecimento de elementos atonais. Essas especificações serão esclarecidas pelos comentários que acompanham cada peça. A indicação de uso de elementos nacionalistas refere-se à alusão ou presença de modos, melodias, ritmos ou gêneros do folclore ou da música popular brasileiros. Sob o título ‘com inclusão de técnicas pouco convencionais de produção sonora’ agrupamos obras que apresentam efeitos sonoros produzidos no instrumento, mas que fogem à emissão sonora tradicional, como é o caso, por exemplo, de multifônicos, de sons percussivos emitidos com as chaves do instrumento, de notas cantadas para dentro do instrumento e outros. Efeitos sonoros produzidos sem o instrumento, como, por exemplo, o ruído de percussão dos pés contra o chão, não foram levados em consideração e as obras que os utilizam agrupados segundo características predominantes.

Organizado da forma explicada acima, o conjunto de obras pesquisadas se apresenta agrupado da seguinte maneira:

  • OBRAS EM IDIOMA TONAL

  1. Tonal e tonal livre sem elementos nacionalistas

  2. Tonal ou tonal livre com elementos nacionalistas

  3. Tonal livre com inclusão de técnicas pouco convencionais de produção sonora

  • OBRAS EM IDIOMA ATONAL

  1. Atonal livre

  2. Atonal serial

  3. Atonal com inclusão de técnicas pouco convencionais de produção sonora

 

Nas obras abordadas, foram encontrados vários tipos de notação, que podem ser descritos como tradicional, proporcional, entendido nesse contexto como: a) duração dos sons dada pela maior ou menor proximidade das cabeças das notas, b) proporções definidas, escritas, porém, em símbolos criados pelo compositor) 9 e, finalmente, notação contida em retângulos (ou semelhante), os quais são agrupados e executados de maneira específica, também determinada pelo compositor.

Para a classificação do grau de dificuldade das peças foi feita uma adaptação do sistema usado por Sarah Hamilton no artigo An Annotated Bibliography of Canadian Music for Oboe, Oboe d’Amore, English horn and Bass Oboe found in the Canadian Music Centre’ (HAMILTON 1998), que julgamos valioso por sua fundamentação a partir de critérios objetivos e pela complexidade dos pontos levados em consideração. Na adaptação para o fagote, mantivemos os pontos por ela abordados na avaliação das obras para oboé, como extensão, saltos intervalares, freqüência de pausas, velocidade, diferenciação de dinâmica, complexidade rítmica, mudanças de fórmula de compasso, mudanças de clave, articulação, exigências quanto à resistência, uso de técnicas contemporâneas como multifônicos, frullato e outras. Redefinimos, porém, as competências necessárias à execução de obras em cada um dos níveis de dificuldade, segundo as características específicas do fagote. Já a denominação dos graus de dificuldade segue a proposta de Saloméa Gandelman em 36 compositores brasileiros: obras para piano (1950-1988) (GANDELMAN 1997), que definiu três níveis (elementar, intermediário e avançado). Diferentemente de Gandelman, optamos por subdividir cada nível em dois (em vez de três) graus, completando assim, no total, seis graus de dificuldade (elementar I e II, intermediário I e II etc.). As indicações de andamento através do metrônomo devem ser relativizadas por dependerem das subdivisões da unidade do tempo. As aqui apresentadas são pensadas para pulsação em semínima.

Classificando as peças, optamos, em alguns casos, por atribuir um nível específico, apesar de alguma característica, normalmente a extensão, sinalizar um nível mais elevado. Assim procedemos porque a característica que foge do nível não é forte bastante para fazer mudar a avaliação da peça como um todo.

Os ítens que configuram cada nível devem ser entendidos não como características obrigatórias, mas como referências para a descrição. Cada um dos níveis apresenta as características descritas a seguir.

Nivel elementar I

Extensão do fá 1 10 ao ré 3; poucos saltos maiores do que uma quinta; pausas frequentes; poucas indicações de dinâmica; colcheia como subdivisão menor; andamento máximo MM=100; somente compassos simples; armadura de clave com até dois bemóis ou dois sustenidos.

Nivel elementar II

Extensão do ré 1 ao ré 3; poucos saltos maiores do que uma quinta e menores do que uma oitava; algumas pausas; algumas mudanças de dinâmica; staccato em seqüências curtas; semicolcheia como subdivisão menor; andamento máximo MM=108; compassos simples e compostos; armadura de clave com até três acidentes na ou alguns indicados dentro da peça.

Nivel intermediario I

Extensão do si b 0 ao si b 3; poucos saltos maiores do que uma oitava e menores do que duas oitavas; resistência moderada como requisito; mudanças súbitas de dinâmica; staccato em andamento rápido (máximo MM=112, subdivisão em semicolcheias) ou em seqüências de extensão moderada; fusa como subdivisão menor; andamento máximo MM=126; compassos  derivados indiretos 11; mudanças de clave; armadura de clave com até quatro acidentes ou frequentes acidentes indicados dentro da peça.

Nivel intermediario II

Extensão do si b 0 ao ré 4; saltos menores do que duas oitavas; resistência prolongada como requisito; mudanças súbitas e extremas de dinâmica; semifusa como menor subdivisão; andamento máximo MM=138; staccato em andamento rápido (máximo MM=126) ou seqüências longas; mudanças de compasso; acidentes em número ilimitado; uso de até duas técnicas pouco convencionais de produção sonora em poucos momentos da peça.

Nivel avançado I

Extensão do si b 0 ao mi 4; saltos maiores do que duas oitavas; resistência grande como requisito; nenhuma limitação de andamento e dinâmica; passagens em staccato duplo; encadeamento de compassos derivados indiretos diferentes; uso frequente de técnicas pouco convencionais de produção sonora; inclusão de notação gráfica.

Nivel avançado II

Nenhuma limitação de extensão, andamento, técnicas, dinâmica, staccato, metro; estruturas rítmicas irregulares, não baseadas em divisões ou multiplicações de uma unidade de tempo padrão; estruturas melódicas rápidas, não baseadas em escalas, arpejos de acordes ou repetição de uma unidade melódica.

O termo resistência é aqui entendido como o conjunto de condições físicas, adquiridas através de treinamento, necessárias a um músico para o exercício da atividade corporal exigida pela ação de tocar um instrumento. Para a execução do repertório, no caso de um fagotista, são necessários:

  • preparo do sistema respiratório, basicamente para duas finalidades: garantir uma capacidade respiratória suficientemente grande para a duração da frase e criar a habilidade em dosar e prolongar a expiração;

  • domínio sobre a musculatura facial para manter e adaptar a embocadura às exigências da peça;

  • mobilidade da língua para garantir a velocidade necessária aos ataques repetitivos em staccato;

  • tônus muscular e flexibilidade suficiente para se estar preparado para os movimentos repetitivos e de longa duração dos dedos.

Estes ítens, que fazem parte da resistência, são o pré-requisito para o domínio das seguintes exigências técnicas básicas:

  • emissão de notas dos diversos registros;
  • execução de saltos intervalares, especialmente quando em legato;
  • mudanças de dinâmica;
  • staccato em seqüências;
  • execução de frases longas sem possibilidade de respirar;
  • execução de trechos em andamento rápido.

Vale observar que a não menção sistemática, nas análises das obras, do total dos aspectos composicionais ou instrumentais, mostra que a autora do trabalho não considerou significativos, para os fins desejados, os tópicos omitidos.

A dissertação está organizada em três capítulos. No primeiro, inicialmente, o instrumento é caracterizado, após o que são apresentadas as várias funções que o fagote exerce na orquestra, em conjuntos de música de câmara e como instrumento solista. São citados os compositores de cada época que mais o valorizaram, através de concertos para fagote e orquestra, obras para fagote solo ou com acompanhamento de piano. Com esse breve resumo da literatura fagotística, queremos acompanhar o desenvolvimento da escrita para o instrumento e entender quais os recursos técnicos que um compositor contemporâneo tem à disposição.

Como no mercado musical são usados dois modelos de fagote, o francês e o alemão, fazemos uma comparação das particularidades sonoras e técnicas (acústicas e mecânicas) de cada sistema, além de apresentar as particularidades da textura em obras francesas desse século (que, em certos aspectos, vão além das características encontradas no repertório para o fagote alemão) e contextualizá-las historicamente. Explicando como se deu a convivência dos fagotes alemão e francês no Brasil, procuramos suas possíveis conseqüências na escrita do repertório brasileiro para fagote.

A coexistência dos dois tipos de instrumento nos levou a pensar na hipótese de ter ela gerado uma diferenciação na produção composicional, diferenciação que, talvez, pudesse estar mais acentuada nas obras solo. Todavia, antecipando um dos resultados da pesquisa (obtido pela resposta dos compositores à última pergunta formulada no questionário - se pensaram, ao escrever para fagote solo, num intérprete ou num determinado modelo de fagote), esta não se confirmou. Muitos compositores, ao escreverem para fagote, não tiveram nenhuma preocupação quanto ao tipo de fagote a ser utilizado.

A apresentação e análise do conjunto de obras encontram-se nos capítulos dois e três. No segundo capítulo, temos as obras para fagote solo em idioma tonal com as subdivisões acima discriminadas. O terceiro capítulo reúne as obras atonais com seus respectivos subcapítulos. No anexo encontram-se a carta circular aos compositores, as indicações onde encontrar as partituras das obras e uma relação dos endereços dos compositores, além do artigo referente à obra Momentos, de Emílio Terraza, na revista Sensus. Após a defesa da dissertação também foram incluídas no anexo as análises das peças de Ernst Mahle e Gustavo Koberstein, muito tardiamente enviadas para nós, razão pela qual não puderam entrar no corpus do trabalho.

Com relação à bibliografia usada para esta dissertação, recorremos basicamente a publicações sobre a história do fagote e livros e artigos de revista que serviram como exemplos de organização para o nosso catálogo. As publicações históricas se dividem em historiografia do fagote em geral, que tratam do desenvolvimento do instrumento, e em análises que têm o enfoque no Brasil. Desses últimos, queremos destacar o artigo de Aloysio Fagerlande, ‘Uma pequena história do fagote no Brasil’ que foi publicado, dividido em duas partes, na revista Eldorado (FAGERLANDE, 1998). Nele, o autor afirma que não existe repertório brasileiro para fagote solista anterior à Ciranda das sete notas, obra para fagote e orquestra de cordas de Heitor Villa-Lobos, escrita em 1933. Por esta razão, limitamos a nossa pesquisa a períodos posteriores. A dissertação de mestrado de Márcio Zen intitulada Os Fagotes Buffet e Heckel: Um estudo comparativo, serviu como base para a discussão das diferenças entre os dois modelos e sua coexistência no Brasil. Entre os catálogos consultados constam a mencionada bibliografia de Koenigsbeck e mais dois outros tratando de obras com fagote: o de Burchard Bulling, a Fagottbibliographie (BULLING 1989), e o de Jon Beebe, Music for unaccompanied solo basson: an annotated bibliography (BEEBE 1990), além dos já citados trabalhos de Saloméa Gandelman (GANDELMAN 1997) e Sarah Hamilton (HAMILTON 1998). O formato encontrado para a catalogação das 36 obras foi baseado nesses trabalhos. Constata-se que quase não existe material bibliográfico sobre as peças em si, exceto em relação à obra de Francisco Mignone. No livro Francisco Mignone - o homem e a obra editado por Vasco Mariz (MARIZ 1997) há um capítulo escrito por Eurico Nogueira França sobre sua música de câmara, que menciona e analisa, sem entrar em maiores detalhes, as 16 Valsas para fagote solo. Já a dissertação de Elione Alves de Medeiros (MEDEIROS 1995) é um estudo mais aprofundado da mesma obra, sob os pontos de vista interpretativo e analítico. Para outras peças, a comunicação pessoal com Noël Devos foi bastante importante e esclarecedora, já que várias obras foram escritas para ele, que pôde então acompanhar e influenciar de perto a escrita das mesmas.  Ainda está por ser realizado muito trabalho em relação à Música Brasileira: esperamos, porém, que esta dissertação faça com que seja dado real valor às obras para fagote solo, para que, enfim, elas sejam apresentadas cada vez mais para o público, seja em forma de recitais, gravações, edições ou publicações musicológicas.

No catálogo, apresentamos aquelas características composicionais e instrumentais que nos pareceram mais relevantes; indicamos, se conhecidos, data e local da composição, duração aproximada; data e local de estréia e grau de dificuldade das obras estudadas. Quando existem gravações da peça, indicamos a gravadora, número da gravação e nome do artista executante. A indicação do local onde encontrar a partitura, seja em arquivos públicos, editora ou arquivo pessoal do compositor, ajudará na sua obtenção. As informações foram organizadas comoindicamos a seguir, levando-se em conta que as informações sobre as obras (publicação, data e local de composição e de estréia etc.) foram apresentadas em forma de sinopse, as demais, em texto corrido.

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1. Os quatro são: BULLING, Burchard. Fagott-Bibliographie. Wilhelmshaven: Noetzel, Heinrichshofen-Bücher, 1989; BEEBE, Jon. Music for unaccompanied solo bassoon: an annotated bibliography. Jefferson, North Carolina, and London: Mc Farland 1990; BARTHOLOMÄUS, Helge. Das Fagottensemble. Kleines Handbuch zur Musikpraxis. Berlin: Feja 1992; KOENIGSBECK, Bodo. Basson Bibliography - Bibliographie du Basson - Fagott Bibliographie. Monteux: Musica Rara 1994.

2. As obras encontradas são: para fagote solo - 16 Valsas de Francisco Mignone e Catala op. 93c de Ernst Widmer; para fagote e piano - Poema Camerístico, com fita magnética de Jorge Antunes, Três Peças de César Guerra-Peixe e Três Estudos de José Siqueira.

4. Musicon - Guia da Música Contemporânea Brasileira 1998. Centro de Documentação de Música Contemporânea. Campinas: CDMC/UNICAMP 1998.

7. A duração é indicada arredondada para quartos de minutos. Quando a peça possui mais do que um movimento, a duração é a soma dos movimentos, sem considerar o tempo gasto entre eles (=duração total netto).

8. Obras em idioma modal aparecem no bloco das em idioma ‘tonal e tonal livre’. Se exclusivamente escritas em um modo, o tratamento harmônico não é ortodoxo. Os casos observados mesclam modalismo e tonalismo.

9. Estamos cientes de que John Cage usa o termo ‘notação proporcional’ em outro contexto, que é a determinação da duração através da indicação dos segundos em papel milimetrado.

10. A indicação de alturas segue a convenção brasileira, na qual o dó 3 é o dó central do piano. SCLIAR, Esther. Elementos da Teoria Musical. São Paulo: Novas Metas 1985, p. 123.

11. Designação empregada em SCLIAR, Esther, p. 85, para indicar compassos constituídos a partir da soma de compassos primitivos diferentes (binário e ternário).

 

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